_“trabalho sexual”, corpo & dinheiro em uma etnografia sobre programas e seus garotos

_apresentando a minha tese de doutorado, recém-publicada no respositório da USP

_erinhoos
3 min readMar 5, 2024

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Em 2017 eu apresentei para vocês os resultados da minha dissertação de mestrado em Antropologia Social sobre o Bananal, o Autorama e a construção social do parque Ibirapuera como mais ou menos ligado à temática da diversidade sexual e de gênero. Todavia, desde aquela época eu já tinha um impulso enraizado em interesses pessoais em desenvolver uma pesquisa sobre prostituição masculina (1), inclusive escrevendo um artigo que antecipava os resultados que ora constam de forma completa na minha tese de doutorado, publicada recentemente no repositório da USP.

Fruto de difíceis quase-seis anos de trabalho errático, desalentado de qualquer bolsa de pesquisa e impactado pelo isolamento social e suas mazelas derivadas, a tese “Uma aposta no abismo: a produção laboral do sexo em uma etnografia de programas, seus corpos & seus sujeitos” tem como objetivo, partindo do fenômeno do programa como célula analítica, elaborar uma reflexão sobre a produção social do expediente de trabalho, considerando a relação entre circulação de bens e dinheiro e a produção de corporalidades.

Ao contrário do ponto partida que é premissa de muitos estudos brasileiros sobre prostituição masculina, busquei analisar a prostituição a partir do programa como célula atitudinal analítica, postulando que é ele o gesto fundamental e fundante da prostituição como possibilidade. O programa se define pela relação entre pelo menos um garoto de programa (GP) e pelo menos um cliente, é marcado fortemente pela relação etária e por seu aspecto liminar (marginalizado), se apresenta como força associadora, opera em regimes territorializados e aciona e mobiliza uma rede de objetos, atores, actantes, instituições, indústrias e serviços. Esse é o tema do primeiro capítulo, Antropologia do programa.

O segundo capítulo, Corpo e circulação de bens e dinheiro, busca responder à pergunta: como dinheiro faz corpo e como corpo faz dinheiro? Para isso, trago os elementos do trabalho de campo, isto é, o resultado do trabalho de campo conduzido junto a treze garotos de programa e outros atores adjacentes. A partir desse substrato etnográfico, analizo a reprodução entre corporalidades e circulação de ativos financeiros, considerando a circulação de fármacos, atividades físicas e próteses e biotecnologias de gênero.

O capítulo A produção social do sexo laboral ou A produção social do trabalho sexual, terceiro e último capítulo central da tese, foca na desconstrução e reconstrução da ideia de trabalho sexual a partir do exame detido da circulação de convenções laborais e outras acionadas pelos interlocutores de pesquisa. A conclusão, O futuro do programa, resume os principais ganhos da tese, propondo uma agenda de discussões para estudos vindouros e alinhavando em algumas notas os resultados de mais essa errância etnográfica.

Outras discussões importantes perpassam o processo de feitura da tese, como a posicionalidade etnográfica, a crítica da descrição de populações subalternizadas, o fator multiplicador da economia, a liminaridade do programa, as territorialidades, o consumo de fármacos, o risco, o marcador social racial, a amizade como categoria, a produção de personas, o luxo e impactos do isolamento social.

Espero, enfim, com a publicação da tese, trazer aportes originais e relevantes para o debate a respeito da produção social do trabalho no super-capitalismo, relação entre corporalidade e masculinidades, tópicos de prostituição masculina e uma referência do fazer etnográfico-antropológico nos estudos de gênero e sexualidade contemporâneos no Brasil.

Ainda em tempo: Agradecimentos especiais a Marcelo Perilo, que revisou criticamente toda a tese, à minha orientadora Silvana Nascimento e à banca de avaliação, composta por Isadora Lins França, Maria-Elvíra Díaz-Benítez e Thiago Oliveira. A tese é dedicada ao meu esposo Fernando Alves, à democracia e aos garotos de programa.

Também agradeço ao Programa de Pós- Graduação em Antropologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (PPGAS-FFLCH-USP), no seio do qual a referida tese foi gestada, desenvolvida, defendida e publicada.

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_erinhoos

_antropólogo, barista informal, errante incorrigível, cantor de karaokê, sérião nas horas vagas